quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

O Sexo no Papel (por Luiz Otávio Tal)


A estação mais quente do ano, além do sol, mar e dos corpos sarados desfilando nas areias, trás também as mudanças inesperadas de temperatura. Fenômenos já manjados, como o “La Niña”, influenciam todo o clima tropical e despeja em terras tupiniquins uma incidência de chuvas fora do comum, provocando enchentes e acidentes ecológicos. E é neste clima de inconstância térmica, que os leitores da revista Playboy recebem a edição de janeiro.

Há cerca de dois anos a desculpa foi lançada pelos editores da revista e, embora não tenha convencido, já é a resposta padrão: “janeiro é um mês morto”. No entanto, este mês moribundo já conheceu dias melhores. O problema não está em colocar uma desconhecida na capa, mas sim em falta de honestidade. Seria muito mais justo para com o leitor uma coelhinha como estrela, intitulada musa do verão, como acontecia há dez anos atrás, do que um gancho que desmereça os 33 anos da publicação. Anelize Lopes (janeiro de 96), Paula Melissa (janeiro de 97) e Solange Frazão (janeiro de 99), contudo, viraram lenda em meio ao mundo comercial. Tudo isto sem desmerecer a beleza da morena Letícia Carlos, que é a típica brasileira, um violão digno de se dedilhar as melhores melodias. Original de fábrica, a morenaça tem tudo no lugar: uma bunda capaz de deixar sóbrio o mais embriagado dos alcoólatras, seios na medida exata como se apontassem para o horizonte e uma depilação generosa para aqueles que reclamaram do recato nas poses de Juliana Knust.

O grande problema está justamente no modo como Letícia foi apresentada aos leitores. Logo na chamada de capa a primeira decepção: “Letícia, a namorada que todo craque queria”. Ora, já não fazem mulheres como antigamente. A moça se sujeitou a um título tão medíocre que se vangloria em ser mais uma “maria-chuteira”. E mesmo neste caso ainda há controvérsias, uma vez que o jogador em questão é conhecido por não gostar da fruta. Teria sido muito mais honesto alçá-la ao posto de musa do verão, mesmo tendo no currículo este curioso affair.

Em termos técnicos o ensaio surpreende pela beleza, começando logo pela capa. As fontes não incomodam e o fundo branco serve para realçar ainda mais a beleza da morena, ao mesmo tempo em que presta uma homenagem à revista dos anos 80. Mérito também do fotógrafo J.R. Duran, que parece estar inspirado neste ano de 2008. A única exceção é a foto em que Letícia segura um troféu embaixo das pernas. Uma foto de extremo mau gosto e que não transmite nenhuma sensualidade. Destaco também o cuidado com as locações de Bruno Geraldini. A escolha de um hotel desativado, logo rústico, contrasta muito bem com o biótipo da modelo. As fotos prediletas são as da página 81, em que a moça engatinha completamente nua sob um emaranhado de colchões, e a da página 85, muito parecida com uma do ensaio da Tiazinha (Março de 99) em virtude da peruca fake.

A propósito, uma edição genuinamente brasileira, com mais duas modelos nacionais nos ensaios internos: a gaúcha Jéssica Borges, que já havia sido coelhinha na edição de novembro de 2002 e a pernambucana Sasckya Porto, descoberta por Hugh Hefner.

Tantas mulheres e o grande mérito da edição, no entanto, foi parar nas mãos das matérias e entrevistas, começando pelo grande bate-papo com Martinho da Vila. De cigarro na mão, camisa desabotoada e aquele sorriso característico, o sambista é de uma franqueza ímpar ao longo de sete páginas. Confessa o descontentamento com as escolas de samba, que estão a cada ano mais comerciais, optando pelo previsível ao invés de valorizarem a originalidade do passado, e também não se mostra hipócrita ao falar de desafetos no mundo da música, casos com bebida e em admitir que, mesmo insatisfeito com o samba pode aparecer na avenida em fevereiro, afinal de contas “todo malandro é malandro e todo mané é mané”.

Entre os artigos e reportagens me rendo mais uma vez ao texto hipnótico de Ivan Lessa. Apesar de ser a coluna com o menor índice de leitura da publicação, é a primeira que leio todos os meses. Outro dia até comentei numa mesa de bar, entre uma cerveja e outra, que estou ficando cada dia mais sarcástico graças ao mestre Ivan. Jornalista, ele vê o mundo a partir de Londres, enquanto eu ainda vejo o mundo por meio do próprio umbigo. No entanto, um dia chego lá.

Apesar de um grande mico, publicarem uma matéria sobre o rali Paris-Dacar em um ano que o torneio foi cancelado, a retrospectiva 2007 é de encher os olhos. Desde o design caprichoso de Thaís dos Anjos à grande sacada de ironizar Latino e Fani – num ano de vacas magras eis os destaques – como colunistas. Em suma, o bom humor é fundamental para relembrarmos momentos que não são dos mais agradáveis: corrupto que se vangloria da impunidade, um presidente que faz cartilha de sua ignorância, um folhetim que apela para o sensacionalismo barato a fim de incrementar a audiência, dentre tantos outros problemas. Esse é o Brasil e como diria todo filho da pátria, para não dizer outra coisa, vai indo.

Por fim, vale lembrar o que a taróloga, Fátyma de Moraes, profetizou na página 30 da seção “Happy Hour”: “A Rainha de Espadas mostra uma atriz soberana e estrategista, que mudará de planos e irá aceitar o convite em 2008. Propostas já foram efetuadas e não aceitas. O contrato será assinado em abril”. Pois então, cruzem os dedos amiguinhos...

No próximo mês respiro aliviado com Mônica Carvalho na capa. Até lá!

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