terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

O Vazio do Fait Divers (por Luiz Otávio Tal)


Ele está presente em todas as capas de jornal. Às vezes em pequenas manchetes, perdidas entre as informações. Já chegou até mesmo ao jornalismo on-line, ocupando o espaço dedicado às últimas notícias. Agora mesmo eu estava navegando pelo site do jornal O Dia e a primeira notícia com que me deparo é a seguinte: “ladrão é pego após roubar duas vezes a mesma casa”. E esta característica não é exclusividade do ciberespaço e do jornalismo impresso. De Gil Gomes a Luis Datena, há tempos vem conquistando a televisão.

O fait divers funciona como um romance do jornalismo; um gênero a parte. É o mecanismo utilizado para a publicação de acidentes e pequenos escândalos, sempre em tons sensacionalistas. Ao contrário dos fatos ligados a pessoas conhecidas ou a categorias próprias (saúde, educação, economia), que são informações que exigem um conhecimento prévio e que desencadeiam desdobramentos, o sensacionalismo trabalha unicamente com o universo externo de cada indivíduo, já que não é necessário cultura para absorvê-lo.

Este tipo de articulação se dá quando há o confronto de, pelo menos, dois elementos de um fato. Esta relação pode ser fruto da causalidade, que une dois termos de uma história a fim de produzir espanto, em que a causa é sempre desviada de sua lógica. A notícia publicada hoje pela Folha Online ilustra bem esta situação: “homem é preso após assaltar rabino com arma de brinquedo em SP”. Neste caso a revelação é sempre mais pobre do que o pressuposto inicial. Espera-se que um bandido promova assaltos com armas de verdade. No entanto, a nota surte o efeito desejado pela existência de uma curiosidade inesperada.

A relação de coincidência também designa o sensacionalismo. O acaso existe em função da variação, logo uma repetição de acontecimentos sempre chama a atenção. A coincidência pode ser de relação numeral, como o exemplo citado logo no início deste texto ou quando revira a causalidade, contrapondo os termos, como uma espécie de antítese. Um bom exemplo é a notícia publicada hoje pelo jornal O Dia On-line: “enterro de mulher que morreu em academia será hoje”. O que se espera quando uma pessoa vai até a academia é que fique com as formas definidas ou, ao menos, com a saúde em dia. Pois foi justamente o contrário que aconteceu com a carioca Natasha Fabrini, de 35 anos, que morreu enquanto fazia ginástica localizada, segundo o repórter Marco Antônio Canosa.

O que se percebe é que esse tipo de jornalismo vem ganhando cada vez mais espaço. Embora considerado um exercício de mau gosto, ele tem apelo popular, uma vez que consegue atingir a massa atomizada, que vive desprendida de memória. Ao final de um fait divers permanecemos mudo, pois os fatos expostos desviam do conceito de cultura.

Nenhum comentário: